Está na hora de mudar isso. Saiba mais sobre o Aikido, arte marcial japonesa que não inclui em seu vocabulário a agressão, a competição e a subjugação do outro
- Publicação:28/05/2013 08:45
Muito utilizado no treinamento de corporações policiais e em cursos de defesa pessoal, o Aikido reúne perfis bem diferentes
Pressão para conseguir encaixar um golpe, ganhar cada ponto e vencer a luta. Lutar pelo primeiro, segundo e terceiro lugares. Derrotar o adversário. Competir para ser o melhor de uma categoria. Nada disso define o Aikido, arte marcial não competitiva criada no Japão na década de 1940 pelo mestre Morihei Ueshiba (1883-1969).
Embora exija precisão de movimentos e rigor técnico, o Aikido não é um esporte de rendimento ou de competição. Bem, na verdade, você compete: com você mesmo. Muito utilizado no treinamento de corporações policiais e em cursos de defesa pessoal, é uma atividade que começou com os homens, mas que hoje é mais praticada pelas mulheres. Só que no Japão. No Brasil, essa realidade é bem diversa, com predominância masculina.
Veja mais fotos da aula de Aikido
Em Belo Horizonte, uma das opções para a prática de Aikido é o Bu Toku Den (casa das virtudes da guerra), no Bairro Prado, coordenado por Alcino Lagares Côrtes Costa, coronel da Reserva da Polícia Militar, professor de Educação Física e de Filosofia e sensei de Aikido faixa preta 4.º Dan (saiba mais aqui) e pelo filho dele, Rômulo Lagares de Souza Cortes, faixa preta 3º Dan. No tatami, é possível encontrar perfis bem diferentes entre os alunos e os aspirantes.
Formada no Teatro Universitário da UFMG em 2012, Idylla Silmarovi foi à aula experimental de Aikido por indicação de um amigo. Ela praticou Kung Fu durante 10 meses, mas o mestre mudou de cidade e ela ficou ‘órfã’. “Acho que a arte marcial tem relação direta com meu trabalho de atriz, com o controle da energia, a resistência corporal e a mudança de estado”, explica Idylla. Junto com ela, o namorado André Campos, estudante de Ciências Sociais. “Vim pela curiosidade e pela filosofia da arte marcial, mais do que pela atividade física. E também pelas técnicas de defesa pessoal”, afirma.
Ídylla chegou ao Aikido motivada pela carreira de atriz. Ela trouxe o namorado André, mais interessado em aprender técnicas de defesa pessoal
Já o profissional de Marketing Max Lothian Porto, de 40 anos, que começou a praticar o Aikido em meados de maio, buscou a atividade pela necessidade de um esporte regular e também pela vontade, desde os tempos da infância, de praticar uma arte marcial. “Meu primeiro contato com Aikido foi pelos filmes do Steven Seagal (clique para saber mais). A partir daí, pesquisei e assisti a alguns vídeos na internet. Finalmente, agora tenho a oportunidade e o tempo para realizar esse desejo”, explica Max. Além dele, uma estudante de 15 anos e um policial do Departamento de Homicídios também estão na turma, mas vamos conhecê-los mais adiante.
Rômulo explica que o Aikido tem como princípio a integração entre corpo, mente e espírito. Bem, você já deve ter ouvido essa promessa em outros lugares, mas como ela fuciona aqui? É simples, mas nem por isso fácil. O espírito, neste caso, nada tem a ver com esoterismo ou religião, e sim com a força de vontade para decidir começar algo. Se você está acomodado na mesma situação há algum tempo e tem dificuldade em sair disso, talvez o Aikido seja o seu lugar. “É necessário renovar esse voto, essa decisão, todos os dias. Se você repete sempre uma coisa boa, isso vai se fortalecendo dentro de você. Por isso sempre lembramos de uma virtude – a humildade – e nos ajoelhamos antes de entrar no dojo (local onde se treinam artes marciais japonesas)”, define Lagares.
O sensei Rômulo Lagares: integração entre corpo, mente e espírito
Desenvolvimento social
Para além da técnica, o Aikido tem desdobramentos no tecido social. Aliás, ele é considerado o ápice da evolução humanitária de uma arte marcial. Seus praticantes acreditam que, quanto mais tolerância e respeito, mais benefícios a sociedade terá. Óbvio, não? “Há um respeito muito grande entre os praticantes, entre os alunos e professores, e também em relação ao espaço. Fazemos uma reverência ao criador da arte, que tem sua foto colocada na parede do dojo - e aos princípios e técnicas ensinados”, comenta o aluno Max.
E como isso se manifesta na prática? Harmonização de conflitos. “De forma diferente de outras lutas, que acabam se identificando com ações violentas, o Aikido está focado nas virtudes do Budô, ou seja, a guerra contra a violência. Não bloqueamos a agressão. E não revidamos. O objetivo dos golpes é conduzir essa energia agressiva para formar seres humanos melhores”, confirma Rômulo.
Daí a grande aplicabilidade do Aikido para formação de forças policiais. “Os princípios do Aikido não incluem a derrota sobre o outro ser humano. A vitória não vem da subjugação do outro. A verdadeira vitória, a definitiva, é sobre si próprio. A evolução vem da fortaleza interior, não da fraqueza alheia”, diz o sensei. O Bu Toku Den de Belo Horizonte é o único a oferecer essa formação aos guardas municipais da capital mineira, além de já formar boa parte dos policiais militares e, agora, está chegando aos poucos à Polícia Civil.
Na técnica ensinada aos guardas e policiais, o objetivo é neutralizar o indivíduo que estiver em situação de risco ou impondo uma situação de risco. “Ensinamos que a maior eficácia da ação depende de zelar pela integridade do ser humano”, define o sensei. Alcino Lagares, presidente da Federação Mineira de Aikido, foi o responsável por incluir, em 2002, esses princípios na Política Nacional de Segurança Pública.
A estudante Larissa e o pai, o policial Fabiano: prática da arte marcial estreitou laços
Ele conta que já usou as técnicas do Aikido algemar pessoas detidas e também para um ‘salvamento’. “Uma vez, estava passando por um viaduto no centro de Belo Horizonte e vi uma pessoa pendurada. Erm princípio, imaginei que seria alguém instalando uma faixa. Depois, vi que se tratava de um cidadão, alterado pelo álcool, que ameaçava se jogar. Parei o carro, liguei o giroflex (luzes de alerta da viatura) para sinalizar e, com as técnicas de imobilização que aprendi, consegui retirá-lo de lá sem que ninguém se machucasse”, relata.