quarta-feira, 9 de maio de 2012

MG não tem estrutura para acolher 'demanda extra' de usuários de crack


Governo anuncia grupo para avaliar internação de usuários, mas não há leitos disponíveis suficientes

Publicação: 09/05/2012 06:00 Atualização: 09/05/2012 06:47
Consumo da pedra virou epidemia e rede de atendimento a dependentes já está saturada em Minas (Túlio Santos/EM/D.A Press - 28/3/12)
Consumo da pedra virou epidemia e rede de atendimento a dependentes já está saturada em Minas

O estado pretende abrir uma nova porta no combate e tratamento à dependência de crack em Minas, mas ainda não tem estrutura para acolher os usuários que entrarem por ela. De um lado, para avaliar pedidos de internação involuntária de consumidores da droga, o governo mineiro promete para até o fim do mês a criação de um comitê que vai integrar diversos setores da administração, Ministério Público, Defensoria Pública, além do Judiciário e de entidades do terceiro setor. De outro, o serviço declaradamente não tem retaguarda nas unidades de saúde para atender integralmente a demanda cada vez maior de dependentes.

A intenção do grupo anunciado pelo governo de Minas é unir forças para otimizar o recebimento dos pedidos de internação dos dependentes e analisar cada caso, com o objetivo de deliberar sobre a internação involuntária. A medida, que já vigora em Minas e parte de familiares do usuário em um momento de crise, ocorre sem o consentimento do paciente, mas apenas com indicação médica. A proposta, que será discutida hoje, precisa enfrentar seu maior empecilho: dos 2.750 leitos divididos na rede SUS entre pacientes da saúde mental e dependentes químicos, 1 mil são ocupados por internos permanentes e os 1.750 restantes já são 100% ocupados por pacientes flutuantes. Ou seja: falta espaço para dar conta de um crescimento da demanda.

A dificuldade é reconhecida pelo coordenador de Saúde Mental da Secretaria de Estado da Saúde, Paulo Roberto Repsold, que diz ser este um desafio que Minas tem pela frente. “Seria hipocrisia dizer que essa quantidade de leitos é suficiente para toda a demanda do estado. Aumentar esse número e adequar a oferta é um desafio para o governo de Minas, bem como para municípios e governo federal”, afirma. Para ele, “o assunto independe do viés político e ideológico entre as instâncias de governo já que a necessidade maior é equilibrar a oferta de leitos à realidade da população”. O coordenador explica que dos 2.750 leitos disponíveis na rede SUS, cerca de 2.350 são exclusivos da saúde mental e outros 400, aproximadamente, são conveniados em hospitais gerais.

Roberto Repsold acredita que é prematuro dizer que a demanda por vagas para internação de usuários de crack vai obrigatoriamente crescer com a criação do novo grupo, o Comitê Supervisor para Cumprimento de Medidas Compulsórias e Involuntárias. Mas ele diz que há aproximadamente uma década, os leitos destinados à saúde mental vêm progressivamente sendo ocupados por dependentes da pedra. “Com os movimentos de desospitalização, houve uma mudança epidemiológica do doente mental. Aquele que ficava internado agora consegue ser tratado em leitos hospitalares e outros puderam ir para casa. A questão é que uma demanda nova surgiu, que é a dos usuários de crack”, explica. Apesar de não estimar quantas vagas deveriam ser criadas para atender a procura pelo serviço, o coordenador afirma que o tratamento clínico desse tipo de paciente é complexo e quase sempre resulta em internação. “A síndrome de abstinência da droga é muito forte. Por isso, boa parte dos usuários precisa ficar internada para tratar a dependência.”

Segundo o subsecretário de Políticas Sobre Drogas, Cloves Benevides, Minas já apresentou pleito ao governo federal para abertura de leitos e enviou todos os projetos para receber recursos dentro do programa “Crack, é possível vencer”, lançado no ano passado pela presidente Dilma Rousseff (PT). Ao todo, serão investidos R$ 200 milhões em três anos para financiamento de consultórios de rua, leitos em hospitais, unidades de acolhimento, entre outras propostas.

Benevides acredita que o comitê será um avanço nas políticas de tratamento do dependente. “A internação involuntária já existe, mas sem essa estrutura que queremos montar agora, com espaço físico e com a integração de órgãos.” Ele afirma, no entanto, que os pedidos deverão ser motivados pelo usuário ou por um parente. “Somos contrários a estratégias de limpeza social. Não vamos às ruas para internar pessoas.” Quem quiser buscar apoio pode procurar o Ligue Minas pelo número 155.

PARA ENTENDER

Comitê de Acompanhamento de Medidas Involuntárias e Compulsórias 
O QUE É?

Serviço que terá participação de representantes de várias áreas do governo do estado, Defensoria Pública, Ministério Público, Judiciário e movimentos sociais para receber e analisar pedidos de internação de usuários de crack. 

COMO FUNCIONA?

O grupo vai criar padrões e decidir sobre a possibilidade de internação do paciente sem seu consentimento, apressar pedidos de familiares nos casos em que o recolhimento é necessário, garantir vagas e acompanhar medidas em curso na Justiça. Também será atribuição do serviço amparar a família e garantir os direitos humanos do paciente.

QUANDO COMEÇA A OPERAR?

O serviço será discutido hoje entre as partes integrantes e deve começar a funcionar até o fim do mês.

Modelos de internação para dependentes químicos previstos na Lei Federal 10. 216/01
– Voluntária: Com o consentimento do usuário
– Involuntária: Sem o consentimento do usuário e a pedido de terceiros
– Compulsória: Determinada pela Justiça, a pedido do usuário ou de terceiros

NÚMEROS

2.750 é o total de leitos disponíveis em Minas para pacientes da saúde mental, também destinados a pessoas em tratamento por dependência de álcool e drogas

1.000 leitos do total são dão destinados a pacientes permanentes 

1.750 vagas restantes da saúde mental estão liberadas para atendimento flutuante de usuários de álcool e drogas em Minas

100% é a taxa de ocupação desses leitos

10% da população brasileira é dependente de álcool e drogas

1 milhão de mineiros têm problemas com álcool e drogas, o que não significa, no entanto, que todos precisem de internação
 
1,8% da população brasileira, segundo a Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas seja usuária de crack

155 é o telefone do governo do estado para buscar ajuda

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