Jeitinho de autoescolas encurta tempo mínimo de aulas de direção exigido pelo Denatran para exame que habilita candidato a dirigir coletivos e até vans de transporte escolar
Publicação: 05/02/2013 06:00 Atualização: 05/02/2013 07:11
Veículo em que são feitas aulas: Detran admite que empresas oferecem tempo de ensino menor e diz ser difícil fiscalizar |
A principal exigência do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) para formar um bom motorista profissional de ônibus e vans não tem sido cumprida por autoescolas de Belo Horizonte, que marcam exames de direção e aprovam candidatos com tempo de prática até duas vezes e meia menor que o estabelecido pelo Código de Trânsito. Segundo o Denatran, os candidatos à carteira na categoria D só devem ser examinados nas ruas após completarem no mínimo 15 aulas de 50 minutos, em um total de pelo menos 12 horas e 30 minutos de treino. Contudo, ao percorrer sete centros de formação de condutores na capital, a equipe de reportagem do Estado de Minas recebeu propostas de cinco deles para marcar a avaliação em menos tempo, até com pacotes de meras cinco horas totais (menos de 60% do necessário). Mesmo entre donos de centros de formação, há quem admita que a prática é generalizada, e que as empresas que não a adotam perdem clientes. Para especialistas, os condutores podem estar chegando ao volante despreparados para transportar vidas, inclusive de crianças. Já o Detran-MG diz que é difícil fiscalizar fraudes do tipo, mas estuda implantar um sistema de rastreadores de veículo e biometria móvel até o fim do ano.
Esses exames ainda não exigem a marcação da presença pelo sistema biométrico, que confere diariamente a impressão digital do aluno, abrindo espaço para as fraudes. Em meio às negociações, instrutores ofereceram pacotes de 10 aulas com duração de 30 minutos cada. As conversas, gravadas em vídeo pela equipe de reportagem, mostram que algumas autoescolas marcam exames tão logo os alunos iniciam as aulas. O correto, neste caso, seria aguardar pelo menos a conclusão das 15 aulas, para aferir o desempenho do candidato.
Esses exames ainda não exigem a marcação da presença pelo sistema biométrico, que confere diariamente a impressão digital do aluno, abrindo espaço para as fraudes. Em meio às negociações, instrutores ofereceram pacotes de 10 aulas com duração de 30 minutos cada. As conversas, gravadas em vídeo pela equipe de reportagem, mostram que algumas autoescolas marcam exames tão logo os alunos iniciam as aulas. O correto, neste caso, seria aguardar pelo menos a conclusão das 15 aulas, para aferir o desempenho do candidato.
“Isso é consequência dos nossos valores de sociedade, que estão equivocados. Para alcançar o objetivo, não importam os meios. É o velho jeitinho”, diz o advogado especialista em trânsito Thales Lucena. “O condutor de ônibus dirige um veículo pesado, carrega muitas vidas e deveria ser um dos mais responsáveis no trânsito. Dirigir para frente é fácil, mas se o candidato abre mão do tempo mínimo exigido, ele pode deixar de aprender direção defensiva, noções de primeiros socorros e procedimentos de emergência que são aprendizados imperiosos, tanto que a lei os exige”, completa o advogado, dizendo que muitas autoescolas têm dado mais valor ao aspecto financeiro.
O especialista considera que, mesmo que fosse cumprido, o tempo mínimo de curso determinado pelos órgãos de trânsito seria insuficiente. Segundo Lucena, os candidatos à carteira de habilitação D muitas vezes chegam às autoescolas com alguma experiência obtida na clandestinidade. “Mas, partindo do pressuposto de que o motorista que vai tirar a carteira não sabe nada, 15 aulas é muito pouco”, alerta. “Ele até tem noções de espaço e sabe manobrar, mas o importante é se posicionar diante de um imprevisto. Se o candidato consegue ser aprovado com menos tempo do que a lei determina, ou o exame é muito fácil ou ele se prepara independentemente da autoescola”, pontua.
Negociação
Nas visitas às empresas, os “abatimentos” de aulas e horários foram oferecidos por atendentes e alguns instrutores dos centro de formação Carneiro, no Horto (Região Leste), Ouro de Minas, no Bairro São Paulo (Nordeste), Catalão, do Bairro Serrano, Radioativa e Capital, no Padre Eustáquio – essas últimas na Região Noroeste. Na Catalão, por exemplo, o orçamento impresso num cartão publicitário traz o plano de dez aulas de 50 minutos. Mas, ao insistir com a balconista para reduzir um pouco mais o cronograma, ela faz pouco caso, admitindo que a empresa oferece carga horária 33% menor do que é exigido pela legislação. “Acho que vai fazer pouca diferença. Ainda mais que o Detran exige 15 aulas (em vez de 10)”, disse a moça.
Ainda assim, a mulher deixa a negociação em aberto e pede para procurar o instrutor. No início, o homem de meia idade responsável por ensinar candidatos a dirigir um ônibus e transportar pessoas rechaça a ideia de reduzir a jornada de 50 para 30 minutos. “A gente pode ir abatendo. O que não dá é fazer duas (aulas) de 1h40 num horário, porque, senão, dá mais de 10 aulas no final”, disse o instrutor. Perguntado se poderia cobrar o mesmo valor para 10 aulas de 30 minutos, ele para por um instante e pensa no assunto. “Temos de ver como vão vender isso lá (na autoescola). Só se a gente fizer uma hora e depois abater o que sobrar das outras aulas. Mas tem de fazer a conta certinha”, pondera.