segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Viaduto das Almas está entregue ao esquecimento e ao silêncio de sua trágica história


Desativada, estrutura em curva conhecida como uma das mais traiçoeiras armadilhas da BR-040 foi integrada ao patrimônio da União, mas hoje se degrada em lento abandono

Publicação: 03/09/2012 06:37 Atualização: 03/09/2012 09:38
Em meio a escombros, mato e estruturas corroídas, esta obra de arte da engenharia  pode desaparecer se não for transformada em patrimônio arquitetônico (Leandro Couri/EM/D.A Press)
Em meio a escombros, mato e estruturas corroídas, esta obra de arte da engenharia pode desaparecer se não for transformada em patrimônio arquitetônico
Inaugurado em 1º de fevereiro de 1957, ele não tem vida própria e, mesmo não sendo capaz de tomar decisões, começou a ganhar fama de matador em 20 de julho de 1958. Naquele dia, o pequeno fazendeiro José Alves foi o primeiro a perder a vida ao tentar atravessá-lo, ao volante de uma caminhonete. O Viaduto Vila Rica, mais conhecido como Viaduto das Almas, que se tornou tristemente célebre ao produzir viúvas e órfãos em série, hoje está entregue ao esquecimento e ao abandono. Nem espírito dos mortos atribuídos à sua existência ousa frequentá-lo, nem sequer nas noites claras de lua cheia.

Tem-se a impressão de que o Vila Rica, fechado ao tráfego desde 26 de setembro de 2010, apodrece mais rapidamente do que quando os pneus das carretas limavam seu asfalto e lambiam as baixas e frágeis muretas de proteção. Percorrer seus 262 metros, hoje, só a pé ou pedalando. Somando sua extensão aos pedaços da BR-040, nas duas cabeças de pista, lacrados depois da inauguração do Viaduto Engenheiro Márcio Rocha Martins, a caminhada, a passos lentos, dura cerca de uma hora.

A única lembrança de que ali passavam milhares de veículos por dia, além da estrutura de concreto, é um pedaço de mola deixado por caminhão numa das temidas descidas rumo à estreita pista do Vila Rica. Tão estreita que é difícil imaginar que por ali cruzavam-se carretas de 30 toneladas e ônibus com até 50 passageiros. Impossível não pensar em tragédias, como a que levou a atriz Zélia Marinho e mais 13 pessoas, em 1967, e o que tirou a vida, dois anos depois, do cantor Mário Albertini e mais 29. Zélia e Mário eram estrelas da TV Itacolomi.

Obra de arte inaugurada com orgulho

O Viaduto Vila Rica, ou Viaduto das Almas, nasceu na BR-3, batizada de 040 em 1964. Está no km 592 da rodovia, entre os municípios de Itabirito e Congonhas, na Região Central. Ganhou fama de traiçoeiro em uma estrada que teve seu traçado perigoso cantado até em festival da canção, na voz de Tony Tornado. E foi batizado em 1º de fevereiro de 1957 com muita pompa pelo presidente Juscelino Kubitscheck (1902-1976) e o governador José Francisco Bias Fortes (1891-1971). Os dois percorreram os 262 metros do elevado em um carro luxuoso. JK não escondia o orgulho. Estava entregando à nação uma grande passagem para o progresso do Brasil. 

Em1982, a BR-040 ganhou pista dupla em trechos movimentados, mas os viadutos continuaram estreitos e a carnificina não parou. Parentes de pessoas que perderam a vida em tragédias queriam apelidá-lo de Viaduto da Morte. Mas o que ficou e marcou foi Viaduto das Almas. Não pelos mortos, mas para lembrar o curso de águas claras que corre sob a estrutura: o Córrego das Almas. Não houve como não surgir uma história macabra sobre a passagem de nove metros de largura, construída em curva, que começou com o peso de menos de 1 mil veículos por dia, quando as carretas não eram tão grandes, e chegou a suportar os quase 20 mil automóveis que o atravessavam diariamente poucos antes da aposentadoria.

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